A região de fronteira entre Bolívia, Brasil e Peru, no sudoeste da Amazônia, abriga uma vasta área de florestas preservadas e uma imensa diversidade étnico-cultural. Conhecida como MAP por ser composta pelos departamentos de Madre de Dios (Peru) e Pando (Bolívia), além do estado do Acre (Brasil), a região tem apresentado um novo cenário em termos de riscos e desastres naturais nas últimas décadas. Em menos de 30 anos, ocorreram sete eventos extremos, com as inundações mais intensas em 1997, 2012, 2015 e 2021, e a seca de 2017, que causou perdas sociais e econômicas significativas.

De acordo com a Análise Diagnóstica Regional Transfronteiriça da Bacia Amazônica (OTCA/PNUMA/GEF), a construção de megaprojetos para a integração da infraestrutura regional, impulsionada pela exportação de recursos naturais, de minerais e de petróleo, bem como a expansão da agricultura e o desmatamento, estão entre as causas dos eventos extremos mais frequentes na Região MAP, como secas e inundações.  Esses fatores são agravados pelas mudanças climáticas e pelo fenômeno El Niño.

Os impactos socioeconômicos e ambientais de eventos extremos, como a perda de vidas humanas, biodiversidade e terras agrícolas, exigem estratégias de redução de riscos para aumentar a resiliência e reduzir a vulnerabilidade das comunidades e dos ecossistemas.

Nesse sentido, a Região MAP tem experiência de adaptação às mudanças climáticas com a implementação do Sistema de Alerta Precoce (SAP) Trinacional e as informações fornecidas pelo Atlas de Vulnerabilidade Hidroclimática da Amazônia, ambos realizados no âmbito do Projeto GEF Amazônia: Recursos Hídricos e Mudanças Climáticas, implementado nos anos 2011-2018 pela Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e financiamento do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF).

Desde então, o SAP Trinacional tem apoiado a tomada de decisões e aumentado a capacidade de resposta das defesas civis dos três países aos extremos climáticos nessa região de fronteira. Graças, em parte, a esse sistema de alerta antecipado e a seus sistemas de comunicação integrados, em 2015, e diante da maior enchente de sua história, o estado do Acre conseguiu realocar comunidades que viviam em áreas de risco sem perda de vidas.

A intervenção trinacional

Com o objetivo de ampliar o escopo do SAP Trinacional e fortalecer as ações já implementadas pelos governos da Bolívia, Brasil e Peru em relação à previsão e redução de riscos de desastres de inundação na região, no âmbito de seus Sistemas Nacionais de Gestão de Riscos de Desastres, a intervenção “Integrando fronteiras: Sistema de Alerta Precoce nas Bacias dos Rios Madeira, Alto Purús e Alto Juruá” está sendo implementada no marco do Projeto Bacia Amazônica (OTCA/PNUMA/GEF).

O projeto busca consolidar um Sistema Integrado de Previsão e Alerta Precoce Transfronteiriço nas bacias dos rios Madeira, Alto Purús e Alto Juruá, cobrindo 54.463.000 hectares e beneficiando um total de 28 municípios da região, dos quais oito diretamente e 20 indiretamente. Com base em um sistema de monitoramento meteorológico e hidrológico que fornece informações sobre condições climáticas, níveis de rios, riscos de enchentes e secas, o SAP Trinacional deve proporcionar maior segurança a 1,6 milhão de pessoas na região diante de fenômenos extremos.

A intervenção trinacional também facilitará a troca de informações e a interoperação dos sistemas nacionais para a Plataforma Regional de Recursos Hídricos no âmbito do Observatório Regional da Amazônia – ORA, o centro de referência on-line da OTCA para informações científicas e tecnológicas regionais.

Estratégias de implementação

Em 14 de novembro de 2023, o Grupo Técnico Trinacional (GT3), formado por representantes das organizações nacionais que operam os Sistemas Nacionais de Alerta Precoce (Defesa Civil, Serviços Nacionais de Hidrologia e Meteorologia e Agências de Água) da Bolívia, do Brasil e do Peru, se reuniu com os Ministérios das Relações Exteriores da Bolívia e do Peru para discutir o Plano de Trabalho para a organização do Workshop Inicial Trinacional. Esse evento tem como objetivo reunir atores locais relevantes no SAP da região para preparar uma agenda comum para a implementação da intervenção trinacional.

Na reunião, ficou decidido que o workshop será precedido por reuniões presenciais para mobilizar os atores municipais e supramunicipais e as organizações indígenas e camponesas. As universidades e instituições científicas da região também serão mobilizadas.

A participação e o compromisso dos municípios envolvidos e das comunidades locais selecionadas desempenham um papel fundamental nessa intervenção trinacional, desenvolvida sob uma abordagem abrangente e colaborativa para a região transfronteiriça. A experiência do Projeto GEF Amazonas (ACTO/UNEP/GEF) mostrou que o envolvimento e o apoio de profissionais locais, líderes comunitários e organizações da sociedade civil, bem como de membros de órgãos científicos e universitários regionais, que na época estavam reunidos no movimento conhecido como Iniciativa MAP, foram fundamentais para o sucesso das ações planejadas para a implementação do SAP.

Construindo a resiliência da comunidade

O estabelecimento de Sistemas de Alerta Precoce (SAP) na Região Amazônica faz parte do Componente de Adaptação às Mudanças Climáticas do Projeto Bacia Amazônica – Implementação do Programa de Ações Estratégicas para Garantir a Gestão Integrada e Sustentável dos Recursos Hídricos Transfronteiriços na Bacia do Rio Amazonas, considerando a Variabilidade e as Mudanças Climáticas. Esse componente prevê intervenções nacionais, binacionais e trinacionais para a promoção da resiliência das comunidades amazônicas e dos ecossistemas aquáticos para se adaptarem a secas e inundações e ao aumento do nível do mar.

Com base nas experiências da Bolívia, Brasil, Peru e Venezuela na resposta a eventos extremos, o Projeto Bacia Amazônica está implementando três Sistemas de Alerta Precoce na região. Além do SAP Trinacional nas bacias dos rios Madeira, Alto Purús e Alto Juruá, estão planejados SAPs na bacia do rio Mantaro, no Peru, e na bacia do Casiquiare – Río Negro, na Venezuela.

O Projeto da Bacia Amazônica é implementado nos oito países membros da OTCA – Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, com foco no fortalecimento institucional da governança da água nos níveis regional e nacional; adaptação às mudanças climáticas; monitoramento regional dos recursos hídricos e ecossistemas; e monitoramento da implementação do SAP. Espera-se que o projeto alcance benefícios ambientais e socioeconômicos específicos, contribuindo assim para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

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